segunda-feira

Espero


O dia amanhece claro e limpo. Os olhos piscam para se adaptar a esta luz crua e branca que invade a janela. Aqui, neste meu ninho ebúrneo, de lençóis alvos e mantas níveas o silêncio é total. Os vidros duplos da janela impedem a entrada do barulho ainda inexistente da rua. A tv, embora ligada não emite qualquer som. Escolho o silêncio. Escolhi sempre o silêncio, para as maiores emoções, para as superiores sensações, para as palavras mais importantes...

È neste emudecimento sossegado que me encontro, é também nele que me perco em deambulações íntimas, em efabulações infinitas: só nele recordo o que fui, o que não fomos, o que fiz, o que não fizemos.

È aqui, deitada, à espera da luz que me é essencial à vida, que passo as noites e os dias velando, numa espera muda, a chegada de um futuro em que ainda quero acreditar.
Graça

quinta-feira

Descontrolo


Há cinco noites que não durmo, velo-te o sono e os sonhos. Tapo-te, destapo-te, meço-te, a medo, a temperatura do corpo, adivinhando a febre da doença. Levanto-te o tronco para respirares melhor, lutamos com o soro que insistes em não querer no nariz.

O sono por vezes invade-me, a cabeça descai, o corpo cede.

Tu tosses e eu estremeço, acordo assustada, o meu coração bate mais forte, o desespero apodera-se, rezo a todos os Deuses do firmamento, esforço-me por conter as lágrimas, mas não consigo, o medo é mais forte do que eu, as lágrimas molham-me o pijama… sentir-te doente sufoca-me, desorganiza-me, perturba-me até ao mais íntimo de mim, paralisa-me, quebra-me a razão do saber que a doença passa…

Na maternidade nada dói, tudo se faz, tudo de arranja, tudo é prazer, mesmo as birras, os sonhos maus, o tempo finito, a comida deslambida, os mimos, os disparates, os cuidados mais extremos, mas a doença…só o medo da doença legitima a decisão de seres tão único… jamais conseguiria ter outro filho, … porque ele também poderia ficar doente… e eu, morro um bocadinho de cada vez que adoeces…
Gabriela

quarta-feira

Dependência



Este sono induzido que me imponho tolhe-me a mente, prende-me a voz, quebra-me os sentidos. Descansa-me. Liberta-me do tempo que não tenho, da paz que não sinto, da angústia que não consigo apaziguar, da fome que me devora, da raiva que me inunda.
Só assim, consigo repetir todos os dias os mesmos gestos, as mesmas frases, os mesmos percursos.
Só assim sobrevivo, entre o metro e o emprego, entre o autocarro e a casa, entre a sala e a cozinha, entre a cama e a minha alma.

Carolina

sexta-feira

Mãe

Finalmente saiu-te de rajada o que te andava atravessado na garganta há mais de 2 anos: “ Não aguento mais esta merda. Quero uma mulher e desde que a Maria nasceu, aliás desde que ficaste grávida, porra, és só mãe, só mãe, só mãe, e eu? Só servi para te fazer um filho, não foi?”. Tive para responder francamente: “Foi, foi isso mesmo”. Mas mais uma vez fui sobretudo mãe e não quero que a Maria, para já, seja uma filha dividido por dois, transformada numa mochila arrumada de 15 em 15 dias.
Por enquanto a Maria ainda precisa de um pai presente cá em casa.
Por ela, por isso, inspirei fundo, bati a pestana, lambi o lábio, e disse-te baixinho: “amor ando cansada, mas tenho sempre um tempinho para ti, anda, vamos para a cama, vá lá…”.
E tu vieste. E passou-te a fúria, e esqueceste tudo o resto, como é habitual, e eu gemendo aqui e ali, para te agradar, distrai-me a pensar em como seria bom que a Maria tivesse uma mana redondinha, fresquinha a cheirar a leite e a bebé.
Que bom que é ser mãe…


Brígida

(des)Conversas (cont.)

P.S.
Continuas na mesma…
Continuas a telefonar-me fora de horas…
Quisera entender o verdadeiro significado de tal…
Sinceramente, sinto ternura… não sinto mais paixão.
Nem desejo.
Continuas na mesma… sem partilhar comigo o que sentes.
E sabes que para mim, criar intimidade é mais fascinante que a fase de sedução! É uma fase mais serena que a da paixão… mas permite aquela sensação única da partilha de sentires, de afectos, de desejos, de fantasias…a tal da "sincronia afectiva".
Dá uma trabalheira criar intimidade!!
Mas não desisto!
Pois... oxalá um dia entendas a diferença entre desejar e amar uma mulher…


Vanessa

Ainda amantes?

Rolas para longe, depois do fim, (antes ficavas dentro de mim a acariciar-me os cabelos), levantas-te e vais tomar duche (antes aproveitavas todos os minutos e querias ficar com os meu cheiro o resto da noite, ou dia), quando voltas à cama ligas a tv e ficas calado a zipar os canais (antes conversávamos sobre nós, exigias mesmo que te descrevesse o meu quotidiano para saberes a cada momento em que não estavas comigo o que era suposto eu estar a fazer), olhas para o relógio e dizes que a Bé já deve estar à tua espera para o jantar e que talvez os miúdos até já tenham jantado (antes nunca tinhas pressa e a tua vida com a tua família não entrava na nossa intimidade), começas a vestir-te quando reparas (enfim) que permaneci calada. Perguntas-me distraidamente “o que é que tens?” (antes terias acrescentado um querida, ou um meu amor) enquanto abotoas os teus botões de punho. Procuro os teus olhos para te responder, mas não os encontro, pois continuam presos ao noticiário da tv e respondo, perguntando “já não somos amantes, pois não?”


Eunice

segunda-feira

Na cama

..."E quando, enfim, caí nos seus braços, descobri que tanto se me dava que fosse ele ou o Vasco desde que qualquer deles me fizesse esquecer o outro.
È assim que a gente pensa, muitas vezes, apesar das nossa juras de amor eterno, por razões que passam por outros lugares distantes que nem podemos descortinar e que só raramente têm que ver com o que realmente se passa entre duas almas.
Isto, ao mesmo tempo em que o Nuno me dava repetidos beijos no cabelo e eu lhe dizia, convicta, serás sempre o homem da minha vida.
Mas o Nuno tinha esse defeito terrível que certos homens têm de não perceberem que na cama, só na cama a gente tem direito a dizer exactamente o que nos vai na cabeça, e a ser tudo, e que isso é muito importante porque nos ajuda, fora dela, a sermos pessoas verdadeiramente saudáveis e fiéis.
Mas ele não percebia, coitado, e digo coitado por saber que isso o vedava a alguma beleza, e tive então que lhe dar muito mais beijos do que o costume, e fingir que estaria a provocá-lo para aumentar o seu desejo, e ele acabou por convencer-se em aderir àquilo fechando os olhos e agarrando-me como quem se agarra a si próprio para não se atirar duma ponte abaixo.
A cena fora sórdida, violenta, desonesta, e eu pensava que o mais estranho de tudo era que nunca o Nuno atingira antes um fervor tão grande, senão enquanto estava a sentir-se traído como naquela altura, o que me demonstrava à saciedade que, não fosse a infracção, haveria com certeza homens e mulheres que morreriam sem grande conhecimento de si próprios o que à data me parecia imperdoável.
Comigo foi diferente porque enquanto ele comprovou naquela noite que me amava só a mim, eu descobri que não o amava a ele nem ao Vasco, o que me obrigou a estrear, por circunstâncias que tinham contribuído para aquilo e me transcendiam, mais uma semana de desconfortável indignidade pessoal."…

in "Uma Mulher Não Chora"
Rita Ferro
Contexto, 1997
págs 74 e 75

quinta-feira

Amor

"Gostava de saber porque te amo
nesta forma estranha de te não ter
amado nunca."
Virgilío Ferreira

segunda-feira

Penso em ti...

De vez em quando penso em ti …
À medida que se aproxima Dezembro penso cada vez mais em ti.
Penso em como te iria aconchegar no colo, nas tardes dos meses frios que se aproximam e em que estaríamos só nós dois no silêncio morno desta casa.
No Natal já seriamos quatro, uma família inteira.
Questiono-me se serias a princesa dos meus sonhos ou outro rapazinho lindo de olhos esbugalhados para o mundo, como o João.

Penso em ti romanticamente, como todas as mães pensam nos seus primeiros filhos… quando ainda não conhecem as dores, nem as aflições, nem a impotência de ser mãe, quando ainda não vos viram tremer de febre e ser espicaçados por agulhas infernais, quando ainda não viveram o medo supremo de vos perder, quando ainda não sentiram o vómito do cansaço de noites e noites sem dormir, quando ainda não se olharam no espelho e viram as marcar que ficarão para sempre no seu corpo, quando ainda não fizeram contas a todas as despesas que um filho representa, quando ainda não experimentaram o desespero da liberdade comprometida e da responsabilidade infinita, para sempre.

Agora, em finais de Outubro, eu já seria uma enorme baleia a transporta um fascinante ser aquático dentro de mim.
Mas não sou.
Porque não pude. Porque não quis.
E assim, serás para sempre uma memória amarga, de uma escolha solitária e absurdamente difícil…
Muito mais difícil do que alguma vez imaginei suportar…
Madalena

quarta-feira

Conversas na Cama

- Queres fazer amor?
-Não...
-Não?
-Não! Quero fazer sexo selvagem!


Maria

quinta-feira

Tu

Dizes sempre as palavras erradas.
Usas sempre as expressões menos felizes.
Despertas sempre o que de pior há em mim.


Gisela

Partiste

Quando anuncias-te que partias senti uma náusea de aflição. Como é que me ia organizar? gerir tudo? reestruturar rotinas? mudar hábitos? Depois de tantos anos ficar só era assustador.
Depois, partiste.

Os primeiros dias foram difíceis, chorosos, desorganizados. Os miúdos reclamavam constantemente telefonemas para o pai, eu não conseguia encontrar novas referências, esperava ansiosamente os teus contactos, perguntava-te opiniões, sufocava sem os teus braços.

O tempo passou… poucos dias chegaram.

Reorganizarmo-nos, criámos novas rotinas, descobrimos novas competências e outras cumplicidades…Hoje, já não fazes parte dos nossos sonhos nem das nossas conversas… os contactos são cada vez mais espaçados e quase tenho que obrigar as crianças a falar contigo.
Não somos mais, nem menos felizes, temos uma felicidade diferente.

Embora me espante, estamos muito bem obrigada!

A vida é mesmo assim… quem não está, não faz falta!


Mónica

terça-feira

Futuro

P,
é estranho como me fazes falta, como soubes-te tornar-te presente na minha vida. Queiram os Deuses que saibas sempre compreender as minhas emoções. Por favor fica atento, sê inteligente e não me desiludas...


Renata

quarta-feira

(des)Conversas (cont.)

P.S.

Continuas na mesma…
Insistes em que lhe diga que "sempre fomos amigos"...
Claro que somos! Mas fomos mais que isso… lembras? E ela sabe...
Apaixonámo-nos! … eu pelo menos, apaixonei-me…e amei-te.
Continuas na mesma…Gostei de te rever.
Sobra imenso carinho entre nós…eu sei.
Mas a paixão passou
.... ainda me desejas?
Continuas na mesma…
Talvez um dia entendas a diferença entre desejar e amar…



Vanessa

Porquê?

Porque é que não telefonas? Porque é que não me bates à porta? Porque é que não me queres? Porque é que me esforço tanto para não te querer? Porque é que cada vez que estou contigo prometo a mim mesma que será a última vez? Porque é que me digo mil vezes por dia que nós só temos sexo sem qualquer tipo de intimidade? Porque é que te avalio como incapaz de amar? Porque é que me defendo tanto? Porque é que criei para ti uma imagem desprendida e racional? Porque é que constantemente treino o exercício de te matar em mim? Porque é que te defendes tanto? Porque é que não te telefono e simplesmente te digo que te quero e que preciso de ti? Porque é que tu não descobres tudo isto? Porque é que não te digo tudo isto?
Porque é que nós pura e simplesmente não conversamos como toda a gente?...

Cármen

Passado presente

Passaram 10 anos… e ainda tenho saudades dos seus abraços.

Vê-lo, ao longe,(com a certeza de não ser vista) foi um hábito que ficou, tal como um outro, o de passar na sua rua de madrugada (tantas vezes com a cara lavada de lágrimas de outros amores e desamores) para ver a sua janela-farol onde a luz está sempre acesa …
Há uma serenidade em si, e nos espaços que por instantes foram nossos, que ainda me tranquiliza…
Passaram 10 anos…

Carlota

terça-feira

(des) Conversas Telefónicas

P.S.
Sim, tentei contactar-te…
Só agora telefonas, passadas duas semanas… e queres dizer-me o que lhe devo dizer…
Pois… disse-lhe o que sentia, como sempre faço…
Reconhecendo a verdade e lamentando…
A um mail que nos toca… só se responde ao mesmo nível…
Tantas vezes te disse… que assim, nenhum de nós três era feliz…
Cansei de sofrer… e ainda bem, porque hoje sou feliz, sinto-me amada.
Estranhei algo… tanto tempo passado e só agora ela descobriu… agora, que só existe uma amizade entre nós, desde há tanto tempo?
Como se as mulheres não intuíssem a diferença de sentir dos seus homens… quanta cegueira masculina… pensar que as mulheres não sabem, não sentem, pré-sentem…
e quanto amor feminino, que fecha os olhos a pequenos (grandes!) sinais… por amarem.
E agora, sabes o que sinto? Que continuas sem conseguir criar intimidade com uma mulher… conquistas o corpo… e a alma, meu amigo?

Vanessa

segunda-feira

(des)Conversas Electrónicas

De: Vanessa imperfeitosamores@gmail.com
Para: Jessica Imperfeitosamores@gmail.com
Assunto: P.S.


Jessica,

Sei que não vale a pena pedir desculpa. Mas lamento, lamento tudo.
Lamento sobretudo o ter-te enganado, mas lamento igualmente o ter-me envolvido com o homem errado (não nego que o P.S. passou pela minha vida), lamento o facto de teres descoberto e sofreres agora por uma história que é passado já há muito, muito tempo… e que provavelmente nunca teve um presente, porque existias tu.

Lamento o teu sofrimento, mas na época também sofri, e muito. Mas superei. Reencontrei-me e redescobri como é bom amar e ser amada por um homem bom.
Acredito que também vais conseguir fazer o teu caminho…
Espero que fiques bem.

Até sempre

Vanessa
_________________________________________


De: Jessica imperfeitosamores@gmail.com
Para: Vanessa imperfeitosamores@gmail.com
Assunto: P.S.

Vanessa:

Envio-te este mail pois foi a melhor forma que encontrei para te dizer que um gajo enganar a sua companheira é terrivel, mas uma amiga enganar outra é muito, muito pior.
Como percebes, acabo de descobrir o teu romance com o P.S.
Julgo que a vossa história já dura há algum tempo, pois não esqueço aquele lanche de “velhos companheiros de liceu” há mais de 2 anos, em que o teu “amigo” e meu companheiro andou a fazer joguinho duplo. Não sei, se a enganar-me a mim ou a ti.

Demorou tempo, mas consegui reconstituir toda a história, descobri todas as SMS que trocam, encontrei todos os mails. O palerma usava um contacto codificado, as tuas iniciais num nome masculino: Victor Silva.

Com deves imaginar esta é razão mais que suficientes para vos dizer, acabou. Acabou a minha relação com ele e acabou a minha amizade contigo. Eu não gosto de partilhar homens o que (estranhamente) não parece ser o teu caso. (E eu, que pensava que te conhecia. Bom, também pensava que éramos amigas…). Mas, a partir de hoje ele é um homem livre, fica disponível para ti e para quem vier a seguir....

Mas tem cuidado, não saias magoada, porque ou muito me engano ou não fazes o género dele.

Até nunca mais,
Jessica

terça-feira

Alucinação

Vive-se aqui para além do limite, na consciência de que o hoje só vale por isso mesmo...
É estranho como todos estão alucinados na procura de um momento de quaisquer emoções.
É certamente o confronto com o fim do sol, do Verão, com o fim da luz, ampliada pela certeza de que dificilmente nos voltaremos a encontrar. Por isso, arriscam-se amores, intui-se a iminente partilha de corpos, descobrem-se afectos em pessoas com quem nem sequer se conseguiu trabalhar.

E eu, quedei-me a assistir, escolhi não participar neste alucinado ritual de despedida e morte. Será que amadureci? Ou deitei fora um amor que podia ser grande, por um só dia?
Vanda

sexta-feira

Foi bom!

Foi bom ter alguém à minha espera. Receber um abraço apertado e um beijo sentido.
Foi bom partilhar um sofá, a cama, o chão.
É bom dizer amo-te e emocionar alguém.

Dora

segunda-feira

Filmes

"Que dia de merda" pensou, enquanto batia com a porta da rua e descalçava os seus sapatinhos Louboutin beringela, atirando-os pelo ar em voo certeiro até ao já esmurrado cão de loiça que e vaca da ex-sogra lhe tinha oferecido num Natal qualquer e que ela ainda não tinha tido disposição para pôr no lixo.

Atirou-se para o sofá, sentiu as calças demasiado justas, a apertar as coxas: "tenho que voltar ao ginásio, estou gorda que nem uma lontra. Pudera, este mês tem sido vernissage pindérica atrás de vernissage pindérica, onde só servem vinho da pipa e rissóis de camarão. Que porra de trabalho este!"

Pegou numa revista, para relaxar…tinha na capa a mulher do Quique Flores, estudou a foto com atenção: "Há! Então é esta puta com cara de ratazana deprimida que come o Quique Flores à colherzinha? Cabra! Deves ter mais florzinhas na testa que eu euros na conta!".

Largou a revista e ligou a TV, por sorte ia começar um filme bom na Fox, a preguiça era imensa mas foi até à cozinha, era impossível ver um filme sem estar a comer uma pipoquinha doce. "A dieta começa amanhã".
Xanuca B


Texto escrito para um passatempo do blog da pipoca mais doce.

quinta-feira

Dos Livros

“Ela começa a afastar-se. Ao fim de alguns passos volta-se e vê que ele ainda ali está, curvando-se para ver se a base dos sapatos tem uma etiqueta com o preço. O gesto tem algo de inocente e irreverente ao mesmo tempo e ela lembra-se, sem querer, das razões porque ainda o ama. Lembra-se a que ponto se sentiu agradecida quando ele voltou a aparecer na sua vida. Quando o voltou a encontrar estava a começar a ter medo de voltar a ser como antes de ir para Paris: insensível, fechada nos seus livros, sozinha. Lembrava-se do pânico que sentia por todos os seus amigos estarem casados. Tinha até pensado em pôr um anúncio. Mas ele tinha-a aceitado, e tinha apagado o seu desgosto anterior. Ela achava que ele seria incapaz de a magoar como Graham tinha feito. Após anos de relações clandestinas, era refrescante ter um namoro transparente, com o apoio dos seus pais desde o início, com um futuro inevitável e sem dúvidas, com um casamento em que eles também estavam envolvidos. E no entanto, a familiaridade que em tempos a tinha aproximado dele começou a transformar-se em prisão. Apesar de ela saber que a culpa não é dele, não consegue evitar de o associar, por vezes, com um sentido de resignação, com a própria vida a que ela tinha resistido e tinha lutado com tanta força para deixar para trás. Ele não era a pessoa com quem ela tinha imaginado ficar; nunca tinha sido essa pessoa. Talvez por essas mesmas razões, nesses primeiros meses, ao estar com ele, ao se apaixonar por ele, ao fazer precisamente o que tinham esperado dela toda a vida, isso tinha um sabor proibido, altamente transgressor, como uma ruptura no seu desejo instintivo.”

In “O Bom Nome” de Jhumpa Lahiri
Dom Quixote, Pág. 301

terça-feira

Blind Net

Conheço-te há três meses.
Falamos todas as noites. Geralmente adormeço contigo.
Já te contei toda a minha vida.
Julgo saber todas as tuas dores e humores, em pormenor.
És fascinante, romântico, inteligente.
A nossa sintonia é perfeita. No msn acabas as frases que começo a escrever.
Acredito em coincidências, e os nossos nicks completam-se.
Sinto que és o homem com que sempre sonhei.
Apaixonei-me por ti.

E hoje, pela primeira vez vou jantar contigo.
(Socorro! o que é que eu visto?)

P.S – Como é que te vou encontrar, se não te conheço os olhos…?

Andreia

Solidão

Qual é a maior solidão, a assumida ou a mascarada de uma relação?

Eva

quarta-feira

Felicidade

Espingalhas-me quando vens do mar. (não perdeste a mania de te sacudir como um cão molhado para cima de mim).
Depois, deitas-te a meu lado a lagartar ao sol.
Devagarinho as nossas respirações acertam-se. O sol acaricia-nos e inunda-nos.
O silêncio instala-se, a preguiça também, (nem o livro me apetece ler). Por vezes adormecemos, lado a lado (quem sabe se a partilhar os mesmos sonhos?).
Ao fim da tarde partimos, para o duche e para o amor.
Jantamos num sítio qualquer. Bebemos vinho, conversamos.
Todos os verões são assim.
Todos os verões sou feliz.


Cristina

segunda-feira

Reconheci-o

Hoje vi-o.
Reconheci o olhar, o gesto, o modo.
Reconheci o desejo.
Relembrei a cena.
(mas não era eu a actriz principal)

Quantas antes, quantas depois...
fui apenas um número numa estatística pessoal ?
O que é que você faz às emoções?


Catarina

Partir ou Ficar?

Seria tudo tão mais fácil se eu conseguisse definir o que é que quero de ti, identificado um objectivo, delinearia uma estratégia e lutaria para o alcançar. Mas não sei. A contenção, a castração são tão intensas que nem me permito sonhar a hipotética construção de uma relação.
É-me completamente impossível pensar uma relação com um desconhecido, com alguém de quem não conheço os tempos, os ritmos, os sonhos, os medos, a disponibilidade, a capacidade de se dar.

Paralelamente, vivo todas as resistências, todos os meus medos, a minha incapacidade de me expor, que é interna, profunda, inata.

Assim, presa num labirinto de não ditos e de fugas, sinto que não sou capaz... que não tenho resistência, que não posso mais continuar neste ritmo alucinante de nims... (só que absurdamente ainda quero!)

Racionalmente só me resta um caminho... o de te dizer que não sou capaz... que as regras deste jogo são demasiado duras para mim, e que como não sinto nenhuma legitimidade para as alterar, só me resta dizer-te que desisto, que me vou embora...

...assumo aqui, que na esperança vã de que me digas para ficar...
Daniela

quinta-feira

Sincronicidade Afectiva

A,
como fica fácil partilhar contigo sentires...que com outros demoram meses a serem expressos ou nem sequer se conseguem exprimir... nem partilhar.
Talvez porque me sinta ouvida... tal como te apercebes que também te oiço!
Sincronicidade afectiva, amorosamente doce... ou docemente amorosa...?
Sim, há coisas que não me escapam... tens razão.... como acho que não escapam a nenhuma mulher...Mas como nada acontece por acaso...veremos porque as nossas vidas se cruzaram...
Deixemo-nos surpreender pela Vida...Adoro surpresas!
E coincidências...tu sabes!
Beijo-te...

Helena

Obrigada Maria Helena, por mais uma vez ter aceite o meu desafio da partilhar aqui as suas emoções. :)
Xanuca B

quarta-feira

Fêmeas

As fêmeas quando estão com cio, lêem odores, sabores, movimentos, na procura incessante de um sinal do seu macho, e avançam provocando.
Depois, saciadas, resfolegam de prazer e voltam-se para dentro de si, concentrando-se na cria que vão parir.

Embora na sua essência o processo seja um tudo nada semelhante, as mulheres são seres culturais o que torna todo o processo muito mais complexo.

As mulheres quando querem um homem estão atentas a todos os sinais, lêem nas entrelinhas, adivinham os seus tempos, os seus gestos e desejos, mas raramente avançam, porque querem mais do que um macho que lhes dê o prazer da cópula e lhes faça um filho, estupidamente, o que as mulheres querem é um homem para amar.

E os homens têm sempre medo de ser amados, fogem quais animais feridos...
Beatriz

terça-feira

Devir

Não suporto mais os teus tiques e xeliques.
Não vou mais sustentar a falácia que crias em torno de ti, em te assumires perante o mundo como o senhor simpatia e na intimidade seres um neurótico descontrolado.
Não te suporte as birras infantis, os gritos, as portas que batem, nem os saltaricos de princesa doida e lunática.
És estupidamente avaro, no dinheiro, na vida e nos afectos. Não consegues perceber que a harmonia e o prazer não tem preço. O teu único interesse é ostentar apenas perante os teus o teu parco sucesso, que para ti se mede unicamente em dinheiro, no banco.
Lamento que não reconheças que o teu património é o que aprendes, o que ris, o que sentes, o prazer que dás e que podes ter.
Cada instante em que após o teu horário de trabalho continuas a trabalhar em detrimento de nós, morres um bocadinho, cada gargalhada que não compreendes ficas mais pobre, cada abraço que negas nunca o recuperarás, cada aspreza na voz há-de converter-se em fel um dia, cada cêntimo que poupas nunca te servirá para nada (ou talvez o teu extracto bancário mensal te provoque uma leve erecção cada vez que o consultas) porque não o vais usufruir à espera da desgraça que há-de vir.
Tenho pena de ti e estou cansada, durante todos estes anos não quiseste aprender nada comigo, não descobris-te o prazer de dar, de rir, de brincar, de partilhar nem quiseste perceber como a vida flui. Flui sempre, constantemente num eterno retorno, de bem, de bens. Mas para tal temos que ter espaço nela para que as coisas boas possam vir até nós, assim é necessário deitar fora o que nos oprime, dar aquilo que temos demais, libertarmo-nos para novos devires…

Acho que o meu tempo está a chegar, tenho que criar espaço na minha vida para que entre algo novo e bom.

Mariana

Os Normais

Existem pessoas que pela sua normalidade são uma lufada de ar fresco na nossa vida. A sua simplicidade é tranquilizadora, quase comovente. Com elas a conversa é fácil, fluída, as confidência são banalizadas, os sofrimentos reduzem-se à sua insignificância temporária, os afectos são límpidos, tudo é absurdamente são.


Afinal ainda existem homens normais, daqueles que não procuram nada e não temem nada.
Não sei é se terão lugar na minha vida...

Sandra

segunda-feira

Os Incómodos

Deito o telemóvel para longe de mim.
Tapo a cabeça com almofadas para não ouvir o toque insistente.
Avalio as vantagens e desvantagens de mudar de número.
Olho para a estante, em desespero, à procura de alguma manual que me ensine a livrar de um gajo chato.
Porra, porque será que os tipos não encaixam uma queca e vai andando mano? É logo preciso inventar uma estória de amor? Insistir em novos encontros? O gajo é parvo ou quê?
Livra. Eu só queria aliviar o stress e o gajo tinha boa pinta, mas já chega! Cumpriu o dever, pode ir andando. Ele há aí tanto corpinho para comer, que não vale a pena comer duas vezes o mesmo…
Irra, que o telemóvel já está a tocar outra vez e não é que é o gajo, de novo…



Vera

quarta-feira

Perdi-me

Hoje perdi-me...
Perdi o pudor, esqueci os segredos, despedacei a racionalidade e disse-lhe: você tem razão, nós somos inevitáveis.

(Eu e você, você e eu, eu e você, você e eu, eu e você, você e eu, eu e você, você e eu, por mais que não o queiramos, temos um nós).
Você sorriu e disse que sim.

Hoje vou sonhar a possibilidade de sermos uma realidade. Pelo menos, por umas horas vou ser incondicionalmente feliz...

Constança

terça-feira

Cumplicidades

As relações constroem-se de cumplicidades.
Na primeira infância a relação com a mãe tem a cumplicidade da sobrevivência afectiva, depois iniciam-se os processos de cumplicidades mais elaboradas com a conquista de outros significantes... os avós, os tios, os professores, os outros adultos, os amiguinhos da infância... Mais tarde, na adolescência, surgem as cumplicidades essenciais... as primeiras amigas, as grandes confidentes, a partilha dos primeiros segredos... Simultaneamente surgem os primeiros namorados, a troca envergonhada dos corpos, a cumplicidade de uma intimidade não totalmente construída, mas mesmo assim significativa... Depois, as relações começam a definir-se, a assumir contornos mais estáveis... com o namorado, o companheiro ou o marido surge a profunda intimidade da sexualidade partilhada, dos projectos a dois, de um futuro, de uma família... paralelamente delineiam-se outras cumplicidades igualmente importantes, as que estabelecemos com as mulheres significantes da nossa vida: a mãe cúmplice fundamental da nossa maturação, e as amigas...

As amigas são as cúmplices perfeitas... com elas partilhamos tudo... os sonhos, as fantasias, as mentiras, as dores, as frustrações das cumplicidades que adormecem ou acabam com os nossos homens, as sensações de novas cumplicidades que despontam com outros homens... em suma, com elas partilhamos a vida...

Eu tenho a sorte de ter cúmplices de excepção... são mulheres completamente diferentes umas das outras... vivem, sentem, sofrem e procuram o segredo da sua felicidade das formas mais diversas... mas são todas igualmente incondicionais amigas.

Por circunstâncias da vida, pela forma de gostar... umas estão mais presentes que outras...

Existe a quotidianamente próxima, a incondicional, a irmã escolhida pelo coração. Com ela partilho tudo... lágrimas, gostos, desgostos, medos, sucessos e segredos... com ela não tenho guardas, a relação é confiante e sincera... devo-lhe muita da gestão do equilíbrio emocional que tenho conseguido ao longo da vida.

Depois o anel alarga-se e encontram-se as amigas/colegas com quem partilho o trabalho, os humores, as dores, o desespero, as gargalhadas e os choros, oito horas por dia. Num outro elo, surgem as amigas que passam na minha vida na sequência de afinidades fulgurantes e empatias profundas... por fim, as mais distante, geográfica e emocionalmente, mas que cresceram comigo, e com que mantenho cumplicidades que me permitem continuar uma conversa de há anos atrás como se ainda tivéssemos conversado na véspera.

Depois, as que ficam apenas no coração, porque partiram, cresceram de forma diferente e escolheram outros caminhos …

A todas estas minhas cúmplices de eleição devo muita da qualidade da minha vida, com elas partilhei alguns dos meus momentos mais significativos... espero sinceramente, que cada uma delas sinta em mim igualmente, a segurança da cumplicidade que lhes dedico...
Alexandra

quinta-feira

Desassossego

O meu coração bate descompassadamente, quase me salta pela boca.
Tenho a roupa em desalinho, tenho o teu sabor em mim. Tenho a vida do avesso.
Mas estou tão feliz.
Sílvia

quarta-feira

Prazeres

É estranho como partilho com o M. uma sexualidade tão cheia, tão rica, completa e entusiasmante. Muitas vezes, sinto que ele é apenas um espelho de mim, das minhas mais secretas fantasias, dos meus desejos, dos meus mais íntimos caprichos. É tão fácil estar com ele na intimidade, ele faz-me sentir segura, bonita, poderosa, capaz de ter e de dar todo o prazer do universo. Confesso que nunca foi tão satisfatório ter sexo com alguém. E sinto a estranheza desta evidência: com os homens que amei nunca foi assim. Possivelmente, a pressão de amar e de querer ser amada nunca me deixou ser eu, reconheço que por vezes fui insonsa, quieta, controlada, castrada pelo imenso amor que sentia (nuca esquecerei que o P. me disse "porque é que não fazes o que os teus olhos dizem").
Reconheço também, que nenhum dos meus anteriores amantes possuía esta força da natureza, este desespero dos limites do deleite do M. Ele tem uma impetuosidade singular, uma fome de libertar todas as tensões da sua vida através do prazer e uma imensa capacidade de me fazer libertar de mim, dos meus medos, das minhas ansiedades e falsos moralismos. Connosco, é o prazer pelo prazer vivido sem pudor. Mas, mesmo assim, por vezes, ainda procuro em mim o cheiro, o sabor, os contornos, os ritmos, do último homem que amei.
Lia

segunda-feira

Procuro...

Onde é que estás?
Meu príncipe de sonho, meu herói mítico, meu companheiro de vida.
Quando é que vens ler comigo na cama? quando é que acabas o poema que me dedicaste? quando é que partimos na nossa próxima viagem? Quando é que me mostras que sou o centro do teu universo? Quando é que gritas que me amas?Quando é que chegas?

Vem depressa, pois só a ti te posso amar, meu amor.


Raquel

sexta-feira

Achas que é amor?

Não sei que chamar à tranquilidade que me dás, à calmaria que sinto, nem à necessidade de ti.
Não sei como ler tanto afecto, tanta atenção e desejo.
Não sei... como reagir ao teu amor verbalizado.
(sabes que jamais alguém mo tinha dito?)
Não sei, não sei...
Achas que é amor?


Magda

segunda-feira

Saudades do futuro

Cheiras bem. Gosto desse teu cheiro a suor fresco. Gosto do teu perfil quando te abandonas em sonhos (lembras-me os meus filhos quando eram pequenos). Gosto da forma solitária como dormes, ocupando todo o espaço da cama, entrelaçando o teu corpo sobre o meu, sem qualquer pudor de invadires o meu espaço. Gosto do teu abdómen firme e nu. Gosto da ânsia com que te aproprias de mim. Gosto da intensidade do teu desejo que me leva onde há muito já não ía.

Não sei o que vês em mim? O meu ventre já não é liso, os meus seios já não contrariam a gravidade, em torno dos meus olhos surgem vincos de vida, a minha pele já não é fresca como a tua, o meu cabelo precisa de tinta para esconder a alvura das suas raízes.

Bem sei, que os meus filhos são mais novos que tu, mas objectivamente, se tivesse sido mãe mais cedo, poderia ter filhos da tua idade.
Não sei o que vês em mim? Eu, em ti, procuro o futuro que gostaria de ter tido…
São

sexta-feira

Estranhos afectos

Os afectos são estranhos, comportam-se como entidades exteriores, autónomas, arrebatadas. Fogem do nosso controle, da nossa racionalidade.
Os afectos vivem em nós, obrigando-nos ao esforço hercúleo de viver, por vezes, contrariando-os, combatendo-os. (desesperadamente).

Os afectos são absurdos...
Tão absurdos que qualquer explicação é estupidamente ridícula.

Antónia

quarta-feira

Quotidianos

Para alguns os afectos só nascem na ausência,
só são possíveis na distância,
só acontecem na impossibilidade.

Outros fazem do seu quotidiano amar.

Angêla

sexta-feira

Finitude

Foi hoje que tudo acabou. E, estranhamente doeu.
Já nada mais nos liga, nem o amor, nem os papéis.
Hoje as nossas vidas estão completa e legalmente separadas.
Fiquei triste, mas sei que tu também.

Gostei que tivesses comentado que hoje estava um verdadeiro temporal, como no dia do nosso casamento! Eu estava a pensar no mesmo... Afinal não foi em vão, pois não? Valeu a pena!

Foste o meu homem, o meu menino, o meu pai, durante tantos anos.
E depois crescemos de forma diferente, e eu precisei de respirar de conhecer outros braços, outros cheiros, outros olhos.
Continuo a gostar de ti, pelas memórias.
Vou sempre gostar de ti.

Manuela

quinta-feira

Perdoar

Aprendi, na vida, da forma mais dura a importância de perdoar. Só perdoando se consegue seguir o caminho sem aspereza ou amargura. Mas perdoar é um dos mais duros exercícios de realizar. Jamais esqueço a mágoa causada por aqueles que amo. Às vezes passaram mil anos, e eu não esqueço. Perdoo, mas não esqueço.

Não esqueço o dedo indicador que o João me entalou na porta do quarto da avó, quando tinha 4 anos, não esqueço o vestido da boneca que a Margarida me roubou, quando tinha 6 anos, não esqueço a dor da dentada na barriga que a Ana me deu, quando tinha 8 anos, não esqueço a pêra esmagada na cara pela minha mãe, quando tinha 5 anos... São imensas as memórias de mágoas impressas na memória. Muitas, julgo até já as tenha trazido nos genes.

Agora, ainda não te consigo perdoar. Não te consigo perdoar o silêncio, o mutismo, de quando deverias ter falado. Não te consigo perdoar o adiar constante da decisão com a resposta mansa de “o que decidires está decidido”. E não te consigo perdoar a pergunta fatal justamente no instante crucial “é isto o que tu queres?”. Não te consigo perdoar a solidão da espera na sala fria, quando todos estavam a par de mãos dadas. Não te consigo perdoar a crítica muda à decisão que me obrigaste a tomar sozinha. Não te consigo perdoar o abraço que não me deste nem as lágrimas que não choraste comigo. Não te consigo perdoar toda a dor que sinto.

Toda esta mágoa tolhe-me e impede-me de ultrapassar o meu sofrimento, de fazer o meu luto, de respirar sem dor no peito e sem amargura.

Não sei quando ou sequer se te conseguirei perdoar, embora saiba que serás para sempre o pai do meu único filho.

Madalena

sexta-feira

Enganos

" Não me beijes por engano, não me causes maior dano, do que aquele que causas-te no dia em que aproximas-te os teus lábios do meu peito e no momento perfeito, de paz e de assombração, tocas-te o meu coração."
Sérgio Godinho.


Júlia

terça-feira

Banalidade

Hoje, descobri que sou banal. Terrivelmente banal.

Não consigo deixar de sorrir perante essa evidência, logo eu que detesto a banalidade, qualquer que ela seja.

Hoje, enquanto almoçava sozinha ouvi, primeiro distraidamente e depois de forma interessada, a conversa da mesa ao lado, e a estória contada em voz triste, mas com discrição, era igualzinha à do meu grande, grande amor. Ela, no início dos seus 30 apaixonou-se pela maturidade dele. Ele, incapaz de compromisso afectivo, mantém uma eficaz postura nim (reconheci as mesmas mensagens afectivas distantes mas encantatórias, sempre proferidas em quadros não comprometedores, identifiquei o mesmo investimento estratégico dele quando ela assume pseudo posições de ruptura, até o discurso de evitamento não comunicacional era igual).

Sorri, para não chorar, porque tomei consciência de que devia fazer parte de uma qualquer estatística de mulheres apaixonadas por tipos vampiramente egoístas.

Ela, a que contava à amiga a sua estória, fungava docemente por entre os seus longos cabelos lisos, que lhe omitiam parte do rosto. Eu senti pena, também por mim...

Não podia continuar ali, paguei apressadamente e quando saí não resisti a cruzar com ela um olhar de compreensão e um terno sorriso cúmplice.

Saí para o sol quente de Primavera e pensei como às vezes se cresce sem se dar por isso...
Verónica

quinta-feira

Dúvida II

Que fazer? Que angústias...
que caminhos? que segredo...
que futuro?
o que é que eu quero?
onde é que estou?

o que for, será!


Luz

quarta-feira

Dúvida I

Por vezes duvido...

Consumo corpos em busca de afectos...
que não encontro em ti...
porquê?


Rute

sexta-feira

Saudades II

Já não me lembro do cheiro
Já não encontro em mim o sabor
Já não consigo recordar os contornos

Mas não o consigo esquecer...


Alice

Saudades I

Tenho saudades suas ... do seu cheiro, do seu corpo, dos seus beijos, das suas mãos, de si.

Mas como entre nós é sempre tudo tão ausente acho que já me habituei a viver assim.
Com saudades...

Inês

segunda-feira

Diariamente minto

Todos os dias elaboro um monólogo interior, construo mil explicações, balbucio palavras de amor, sussurro despedidas. Todos os dias ralho comigo, porque todos os dias elaboro um erro, entro em desvarios de emoções, consinto desilusões. E todos os dias fico calada, e choro. Vou-me no pranto vazio de quem quer... bem-querer.


Margarida

Uma outra insónia

P. se soubesses a minha noite...depois de falarmos ao telefone.
Bem, fiquei com uma insónia.... algo amalucada....é o que dão telefonemas às 4h da manhã.
Acho que adormeci lá pelas 6h... escrevi-te msgs k não enviei...
amei-te em pensamento...desejei-te ...quase sentindo tua presença... sentindo a tua voz entranhada no meu corpo... beijo-te docemente....

tua, Helena


Obrigada pelo seu contributo Maria Helena. Beijo. Xanuca B

sexta-feira

Insónia

Os lençóis são azuis.
Tu respiras devagar, mansamente, dormes tranquilo e eu, continuo acordada.
Estranha forma de amar esta que me provoca insónias, mas me impede de acender a luz , para ler, ou a televisão para não te acordar.
Os lençóis são azuis, o algodão não é de qualidade, arranha um bocadinho.
O estore tem 86 ranhuras por fila, por onde escorre a luz da rua.
Tu ronronas agarrado a mim.
Eu não tenho sono.
É sempre assim, depois do alvoroço do amor eu nunca tenho sono.
O estore tem 37 filas.
E o sono não vem, nem virá…


Mafalda

terça-feira

Espelho

Existe em mim uma impetuosidade de sentimento que me assusta pela solidão que arrasta. É um desejo visceral de amar incondicionalmente, de ser capaz de todas as locuras, dos maiores desvarios, de muitas aventuras e nunca encontrei um homem capaz de amar assim.

Até hoje, só tive homens aos pedaços (ou pedaços de homens), com uns fui à opera, com outros a festivais de rock; com uns discuti o idealismo alemão, com outros fiquei calada a ouvir o silêncio;
com uns partilhei a cama, com outros apenas o chão; uns namorei na praia, com outros fiz longas viagens de avião, mas jamais encontrei um homem inteiro .... Como eu.


Leonor

domingo

Grito?

Porque é que tu não queres ver? Porque é que finges que está tudo igual? Porque é que me olhas do mesmo modo? Porque é que agora, mais do que nunca, és amorosamente simpático ?

Ainda não reparaste como me refúgio nos livros, como fujo da sala para a cama todas as noites ou como fico furiosa cada vez que irrompes pelo escritório sem bater na porta?

Ainda não olhaste no meu novo pudor, que me faz ao fim de tantos anos de nudez, usar roupão depois do duche e dormir de pijama?

Ainda não viste que mudei a minha imagem, que emagreci, que cortei o cabelo? (lembras-te que há 15 anos te prometi que seria sempre comprido?).

Ainda não atentaste na minha ausência permanente, na aliança que há meses não está no meu dedo, nos meus compromissos profissionais que terminam cada vez mais tarde, nos treinos de autonomia que te tenho imposto, nas minhas fugas de domingo, quando já não aguento nem mais um minuto dividir o espaço contigo?

Ainda não reparaste que nunca mais reclamei da tua apatia sexual, que nunca mais te seduzi, que nunca mais sequer te toquei?
Ainda não me ouviste dizer que estou diferente, que quero outras coisas da minha vida, que a nossa relação já não é válida?
Preciso de gritar?

E hoje, impulsivamente ao passares por mim na casa de banho deste-me um beijo na nuca... e eu tive vontade de gritar, porque senti a minha intimidade violada, quis atirar-te tudo à cara, dizer-te o quanto eras cego... mas não fui capaz... e fiquei calada...
Patrícia

segunda-feira

Inevitável

Não vale a pena fugir do inevitável encontro.
Não vale a pena fugir de si.
Não vale a pena fugir do meu corpo.
Não vale a pena fugir de mim.

O seu inevitável sou necessariamente eu.



Sofia

sexta-feira

Frágil

Porque é que não percebes que eu não sou a muralha que quero fazer parecer, porque é que não sentes em mim as minhas fragilidades, porque é que não me olhas e vez exactamente como sou, quando é que vai descobrir que eu só preciso que tomes conta de mim... Para sempre.
Marta

quarta-feira

Nua

Ontem mostrei-te a minha face oculta,
despiste-me a alma, puseste-me nua,
descobriste cada uma das minhas histórias, todos os meus segredos.
Ontem esqueci-me de mim!

Hoje, divido-me entre um lamento profundo,
porque sei que jamais serei capaz de partilhar a vida com quem sabe tudo sobre mim,
e a alegria de ter sido eu, ainda que só por um instante!


Sara

terça-feira

Choro

Abraça-me, aperta-me com força ou pelo menos telefona-me.
Deixa-me continuar a chorar, mas dá-me colo e diz que me queres, sussurra-me o quanto gostas de mim, pede-me espaço para ti na minha vida, partilha comigo segredos e limpa-me estas lágrimas de miúda tonta e teimosa... mas apaixonada.
Preciso muito de ti.


Paula

sexta-feira

Ela

Ela partiu.
Partiu como quem parte para sempre, com aquele ar ausente de quem espera não voltar.
Partiu... (como é difícil pronunciar a palavra de modo a ter consciência exacta do seu destino, sentir em cada letra a vibração de uma despedida, a sonoridade do adeus, a angústia da saudade).
Mas, ela partiu.
E eles, ficaram.
Ficaram com a imensa solidão do silêncio, do desespero, do choro sussurrado que não conseguiram soltar, com fome do seu cheiro, da sua pele, da sua imensa angústia e desespero, da sua feroz vontade de viver.
Ela partiu.

Luísa

terça-feira

Ausência II

Ela entrou e olhou-o. Desejou-o, e sentiu o rosto molhar-se de tristeza. E, embora ateia, rezou para que o tempo parasse ali.

Ela fixou-o de novo e ambicionou ter uma memória prodigiosa para nunca esquecer nenhum dos seus contornos, porque sabia que só na memória o poderia ter. Depois, tocou-o mansamente, acariciou-o com a ponta dos dedos, como se temesse que à mínima pressão ele se ausentasse para sempre.

Ele olhou-a, abraçou-a com força e sorriu com a segurança de quem prefere a solidão.

Como de costume, amaram-se devagar, em silêncio, eternamente e depois continuaram unidos, calados, a adiar o dia que sabiam não ter.

Já na rua, de manhã, ela sentiu-se tão sozinha que rezou pela segunda vez, implorou perder a memória para esquecer qualquer resíduo de emoções, de repente não queria saber como era desejar, como era querer, como era amar, quis nunca mais sentir nada, quis esquecer-se de si e perder-se de vez.
Isabel

segunda-feira

Coincidência ... (cont.)

Faz um mês que te conheci.... que tu me conheceste...que nos conhecemos... ... pela net... e depois pelo msn... algo impensável, que subitamente num dia nascesse um sentimento para além de uma amizade!!! Mas aconteceu!!!!... A comunicação escrita rápida, telepática, surprendentemente sincronística que eu sempre procuro... (com a mania das coincidências!!!) surgiu... logo se tornou numa comunicação em que o tempo kronos vira tempo em kairos, tempo da alma... e eis senão quando se perde a noção do tempo... comunicamo-nos durante horas, lembras?...
Sim, era dia 25 de Abril, feriado... estivemos ligados mais de 8 horas…as coincidências gerando risos, quando líamos do outro lado o que ainda estávamos a escrever…
Desde esse dia não parámos de comunicar, por telefone, por msgs, por mail... sempre com alguma sensação de que algo de sincronístico nos ligava, que o pensamento de um desencadeava o movimento e a comunicação do outro... de um dejá vu que emerge... como se sempre nos tivéssemos conhecido... Sim, eu acredito em coincidências, de que as vidas realmente não se cruzam por acaso... e tu dizias que sentias que já me conhecias... até fiz a nossa sinastria e tudo se confirmou!Como nos sentimos bem um com o outro, a comunicar de várias formas... ... e quando estamos juntos... sempre é tempo em kairos...

Helena, 25 de Maio de 2007


Nota: Obrigada Helena. Aguardo próximos episódios desta história de tempos coincidentes... Xanuca B.

domingo

Ausência I

Adormeço enroscada em ti.
De manhã, espreguiço-me e o meu ombro toca o teu, o frémito do desejo acorda e começamos de novo a amar.
Estou atrasada.Visto-me e despeço-me como se houvesse o amanhã que não há.

“Até logo” digo. (“Volto quando quiseres” - não digo, mas sinto).


Isabel

sexta-feira

Coincidência...


Há uma cena linda no filme Orquídea Selvagem... que sempre me deixa emocionada... pois pode ser o momento em que o desencontro gera o encontro...tal como um toque de mãos... ou o toque do "dedo de Deus"... ou o do ET!! Carré Otis (interpretando a jovem e bela Emily Reed) afasta-se desistindo do seu desejo por Mickey Rourke (interpretando James Wheeler, muitimilionário expatriado americano)... no último momento ele agarra-lhe o braço não resistindo... e reconhecendo a paixão... amam-se loucamente no chão... O filme passa-se no Rio de Janeiro, no Carnaval. (One of Wild Orchid's love scenes between Mickey Rourke and Carré Otis had to be trimmed so that the film could gain an R rating for American release (the uncut version was later released on home video); a widely circulated rumor had it that Rourke and Otis, who were living together at the time, had actually had sex while the scene was filmed, though Otis later denied it.)
Algures em Lisboa, 2.30h da manhã, ele agarra-me o braço antes de eu entrar no carro... abraça-me e beija-me... longa e ternamente…É nessa fracção de segundos, em que a alma se solta e o coração obedece... e o corpo se entrega à paixão de um beijo... que se sente que o encontro é possível... mesmo que por momentos... é tempo em kairos...
Início de uma paixão….sim, hoje sei que foi.
Mas também de um filme… de curta metragem!

Helena, 28 de Abril de 2007
Nota: Obrigada Helena pelo seu primeiro contributo. Beijo. Xanuca B

quinta-feira

Acomodo-me

Acomodo-me no teu colo, ajeito-me no teu abraço, encaixo a cabeça no contorno do teu ombro, sinto na nuca o teu respirar manso. Fico calada e quieta, finalmente consigo descansar. Tens o dom de afastar de mim os fantasmas e as angústias, tens o poder de adormecer em mim a fúria que nasceu comigo, apaziguas-me o passado, prometes-me um futuro tranquilo. Escolho ficar aqui, neste mar da calmaria que és tu. Estou cansada da guerra de procurar o amor.
Vou recuperar forças para a próxima batalha ou o amor é isto?
Rita

quarta-feira

Procuro

Quero um homem com quem dividir tudo,
Quero um homem que em cada momento perceba o que é essencial ou acessório,
Quero um homem que tenha sempre os braços abertos e as mãos estendidas,
Quero um homem que tenha sempre tempo para mim.

Quero um homem que me olhe nos olhos todos os dias,
Quero um homem que não tenha medo de dizer que me ama,
Quero um homem .

Quero um homem ?


Teresa

Um estranho?

A um estranho não se diz nada ou o silêncio é suficientemente esclarecedor?
Com um estranho não se partilha nada ou vive-se a comunhão perfeita do aqui e agora?
Um estranho não nos conhece ou sabe tudo sobre nós?
Um estranho é um estranho. Frio, distante, indiferente, ausente.
Como é que pode um estranho estar tão presente em mim?


Clara

terça-feira

Dois

Não percebo como é possível gostar no silêncio do não dito, mas gosto.
Não aceito desejar um desconhecido, mas desejo.
Não entendo como partilhar um corpo sem construir intimidade, mas partilho.
Não posso aceitar esta relação adúltera, que não tenho, mas sinto.

Somos dois. Dois animais feridos com medo, dois solitários desconfiados do mundo, dois amantes desencontrados na chuva, duas crianças perdidas na praia, dois velhos sem futuro, dois estranhos em silêncio. Dois, sempre dois, nunca nós, jamais nós.

Fugimos incessantemente da partilha: do passado, do presente, das emoções.
Apenas os corpos se unem em desvario de desejos, de sensações e saciados continuamos incapazes de criar intimidade, de dizer: - gosto de ti.


Laura

segunda-feira

A morte de um amor

Meu amor,

Sinto frio. Um frio de dentro, daqueles que nos dão a exacta medida do quanto dói a solidão. Porque um outro, a existir, estaria necessariamente colado a mim, a aquecer-me.

Mas não, estou sozinha numa solidão que não sei bem se escolhi ou se me foi imposta por ti, e tenho frio.

Nunca aceitei a ideia de morte, mas agora, aqui, gelada, pressinto uma morte que não sei se serei capaz de viver. A morte do meu maior amor, do meu amor de adolescente, do meu mais belo amor.

Já não te amo. Mas ainda te quero, não de desejo, mas do velho hábito do teu corpo, para tentar descobrir se os hábitos valem mais do que as novas emoções.

Voltei a desejar, um corpo diferente, franzino e vadio, que me fez redescobrir múltiplas emoções, tão diferentes das que partilhei contigo ao longo de todos estes anos em que permanecemos adormecidos na segurança frouxa de um suposto amor feliz.

De repente, quase de um rompante, redescobri o meu corpo, a minha sensualidade, tornei-me mulher. E tu, na tua indiferença simpática, não reparaste, não sentiste, não percebeste que o fiz na procura cega de validar o nosso amor, mas ele já não existia.

Eu fui deixando de te amar devagarinho, mansamente, sem querer acreditar que o fazia, porque não gosto de desistir e porque acreditei que resistir era mais importante do que eu. Mas, acabei de descobrir que amar já não é viver à espera de nada e que ainda pode ser uma emoção intensa de desejo.

Tu, ao fim de todos estes anos és um pedaço de mim, mas para continuar a viver vou ter que capitular, vou ter que separar-te de mim, reconstruir o meu eu, crescer, qual mãe que pare um filho que se habituou a trazer dentro de si.
Meu grande, grande amor, se tu soubesses como dói a solidão.
Definitivamente, é difícil aceitar a morte da ilusão do maior amor: eu e tu, tu e eu, o nosso nós, a essência de um ser uno que criámos mas que nunca tivemos força suficiente para parir. A nossa união ficou para nós, não a expiámos ou sequer mostrámos ao mundo, o nosso amor não floriu e morreu de solidão.

Tenho frio, sofro a angústia do fim, na procura incessante do princípio da ruína, onde foi o ponto x em que tudo se transformou. Arrasto a culpa de uma fome que já não provoco em ti, que foi que eu fiz? Onde é que matei o futuro?

E agora redescoberta, desejada, pergunto-te meu antigo amor, fui mesmo eu e tu que o matámos, ou a morte é tão banal como a vida.
Ana

Ficção

para todos os homens que passaram na minha vida e permanecem em mim....

Alexandra