quarta-feira

Aproximam-se os 40

Olho-me ao espelho enquanto escovo o cabelo.
Todas as noites escovo o cabelo 100 vezes [como me ensinou a Irmã Ângela há muitos anos atrás] e penso na vida…
Na que escolhi, na que não tive, na que poderia ter tido e não quis.
Olho-me no espelho, escovo e cabelo e penso na vida.
Não sei se me arrependo das escolhas que fiz, mas sei que vão ser definitivas no que respeita a ser mãe.
Eu, que sempre me imaginei com meia dúzia de crianças minhas nos braços, sinto que só vou abraçar os meus sobrinhos.
Aproximam-se os 40 e não tenho uma relação estável.
Olho-me no espelho, caiem-me lágrimas, tenho ranho no nariz [escovo os cabelos com mais força].
Aproximam-se os 40 e só sou amante.
Escovo o cabelo [limpo o nariz] e penso em todas as relações que não consegui construir.
Aproximam-se os 40.
Olho-me ao espelho, sei que estou mais bonita que aos 20, ou mesmo que aos 30, sei que sou desejável, mas na alma sinto-me seca, como as pontas do cabelo que estou a escovar...
Sofia

quinta-feira

Recaída

Voltei ao início do ciclo, contrariei todos os meus planos, abandonei as minhas promessas. Recomeçaram os telefonemas, os (des)encontros…

Mas hoje, quebrou-se qualquer coisa de essencial ,não consigo definir ainda exactamente o quê, onde, como. Mas quando saí da sua garçoniere, inundou-me uma tristeza, uma amargura, senti-me sozinha [mais do que alguma vez estive] e tive medo.

Não sei se foi algum gesto seu , uma maior pressão no modo de me tocar, se os seus nebulosos silêncios, ou pura e simplesmente a evidência de uma masculinidade que eu já conhecia de outros braços, que me incomodou.

Em alguma coisa você foi igual, mesmo banal, e para mim era essencial que fosse em tudo completamente diferente. Reconheço que tal ambição era quase impossível, mas hoje, entre nós, senti fantasmas, outras pessoas presentes. Comparei-o e senti que em si igualmente estava latente outro alguém [eu também lhe devo ter trazido memórias].

Talvez tenhamos chegado ao ponto “x”, ao cume de tudo o que é possível entre nós. Partilhámos os corpos, partilhámos o chão [como nunca o tínhamos feito], mas continuámos incapazes de partilhar o essencial [e agora sei que jamais o faremos].

Você não me fez perguntas, não me disse nada [como sempre], não deu o passo em frente. E eu, estupidamente fiquei calada, não tive coragem para quebrar as regras e estragar este jogo “do sem compromisso, sem passado e sem futuro” e agora sei que, tal como temia, este nosso silêncio será eterno.

As minhas expectativas (?) hoje caíram por terra, a partir daqui não é possível mais nada.
Raivosamente choro. Nós temos um espaço [ou melhor, nós poderíamos ter tido um espaço] só que ele está vazio [qual de nós é que não o quis construir?]
Maria Ana

terça-feira