segunda-feira

Espero


O dia amanhece claro e limpo. Os olhos piscam para se adaptar a esta luz crua e branca que invade a janela. Aqui, neste meu ninho ebúrneo, de lençóis alvos e mantas níveas o silêncio é total. Os vidros duplos da janela impedem a entrada do barulho ainda inexistente da rua. A tv, embora ligada não emite qualquer som. Escolho o silêncio. Escolhi sempre o silêncio, para as maiores emoções, para as superiores sensações, para as palavras mais importantes...

È neste emudecimento sossegado que me encontro, é também nele que me perco em deambulações íntimas, em efabulações infinitas: só nele recordo o que fui, o que não fomos, o que fiz, o que não fizemos.

È aqui, deitada, à espera da luz que me é essencial à vida, que passo as noites e os dias velando, numa espera muda, a chegada de um futuro em que ainda quero acreditar.
Graça

quinta-feira

Descontrolo


Há cinco noites que não durmo, velo-te o sono e os sonhos. Tapo-te, destapo-te, meço-te, a medo, a temperatura do corpo, adivinhando a febre da doença. Levanto-te o tronco para respirares melhor, lutamos com o soro que insistes em não querer no nariz.

O sono por vezes invade-me, a cabeça descai, o corpo cede.

Tu tosses e eu estremeço, acordo assustada, o meu coração bate mais forte, o desespero apodera-se, rezo a todos os Deuses do firmamento, esforço-me por conter as lágrimas, mas não consigo, o medo é mais forte do que eu, as lágrimas molham-me o pijama… sentir-te doente sufoca-me, desorganiza-me, perturba-me até ao mais íntimo de mim, paralisa-me, quebra-me a razão do saber que a doença passa…

Na maternidade nada dói, tudo se faz, tudo de arranja, tudo é prazer, mesmo as birras, os sonhos maus, o tempo finito, a comida deslambida, os mimos, os disparates, os cuidados mais extremos, mas a doença…só o medo da doença legitima a decisão de seres tão único… jamais conseguiria ter outro filho, … porque ele também poderia ficar doente… e eu, morro um bocadinho de cada vez que adoeces…
Gabriela