terça-feira

(des) Conversas Telefónicas

P.S.
Sim, tentei contactar-te…
Só agora telefonas, passadas duas semanas… e queres dizer-me o que lhe devo dizer…
Pois… disse-lhe o que sentia, como sempre faço…
Reconhecendo a verdade e lamentando…
A um mail que nos toca… só se responde ao mesmo nível…
Tantas vezes te disse… que assim, nenhum de nós três era feliz…
Cansei de sofrer… e ainda bem, porque hoje sou feliz, sinto-me amada.
Estranhei algo… tanto tempo passado e só agora ela descobriu… agora, que só existe uma amizade entre nós, desde há tanto tempo?
Como se as mulheres não intuíssem a diferença de sentir dos seus homens… quanta cegueira masculina… pensar que as mulheres não sabem, não sentem, pré-sentem…
e quanto amor feminino, que fecha os olhos a pequenos (grandes!) sinais… por amarem.
E agora, sabes o que sinto? Que continuas sem conseguir criar intimidade com uma mulher… conquistas o corpo… e a alma, meu amigo?

Vanessa

segunda-feira

(des)Conversas Electrónicas

De: Vanessa imperfeitosamores@gmail.com
Para: Jessica Imperfeitosamores@gmail.com
Assunto: P.S.


Jessica,

Sei que não vale a pena pedir desculpa. Mas lamento, lamento tudo.
Lamento sobretudo o ter-te enganado, mas lamento igualmente o ter-me envolvido com o homem errado (não nego que o P.S. passou pela minha vida), lamento o facto de teres descoberto e sofreres agora por uma história que é passado já há muito, muito tempo… e que provavelmente nunca teve um presente, porque existias tu.

Lamento o teu sofrimento, mas na época também sofri, e muito. Mas superei. Reencontrei-me e redescobri como é bom amar e ser amada por um homem bom.
Acredito que também vais conseguir fazer o teu caminho…
Espero que fiques bem.

Até sempre

Vanessa
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De: Jessica imperfeitosamores@gmail.com
Para: Vanessa imperfeitosamores@gmail.com
Assunto: P.S.

Vanessa:

Envio-te este mail pois foi a melhor forma que encontrei para te dizer que um gajo enganar a sua companheira é terrivel, mas uma amiga enganar outra é muito, muito pior.
Como percebes, acabo de descobrir o teu romance com o P.S.
Julgo que a vossa história já dura há algum tempo, pois não esqueço aquele lanche de “velhos companheiros de liceu” há mais de 2 anos, em que o teu “amigo” e meu companheiro andou a fazer joguinho duplo. Não sei, se a enganar-me a mim ou a ti.

Demorou tempo, mas consegui reconstituir toda a história, descobri todas as SMS que trocam, encontrei todos os mails. O palerma usava um contacto codificado, as tuas iniciais num nome masculino: Victor Silva.

Com deves imaginar esta é razão mais que suficientes para vos dizer, acabou. Acabou a minha relação com ele e acabou a minha amizade contigo. Eu não gosto de partilhar homens o que (estranhamente) não parece ser o teu caso. (E eu, que pensava que te conhecia. Bom, também pensava que éramos amigas…). Mas, a partir de hoje ele é um homem livre, fica disponível para ti e para quem vier a seguir....

Mas tem cuidado, não saias magoada, porque ou muito me engano ou não fazes o género dele.

Até nunca mais,
Jessica

terça-feira

Alucinação

Vive-se aqui para além do limite, na consciência de que o hoje só vale por isso mesmo...
É estranho como todos estão alucinados na procura de um momento de quaisquer emoções.
É certamente o confronto com o fim do sol, do Verão, com o fim da luz, ampliada pela certeza de que dificilmente nos voltaremos a encontrar. Por isso, arriscam-se amores, intui-se a iminente partilha de corpos, descobrem-se afectos em pessoas com quem nem sequer se conseguiu trabalhar.

E eu, quedei-me a assistir, escolhi não participar neste alucinado ritual de despedida e morte. Será que amadureci? Ou deitei fora um amor que podia ser grande, por um só dia?
Vanda

sexta-feira

Foi bom!

Foi bom ter alguém à minha espera. Receber um abraço apertado e um beijo sentido.
Foi bom partilhar um sofá, a cama, o chão.
É bom dizer amo-te e emocionar alguém.

Dora

segunda-feira

Filmes

"Que dia de merda" pensou, enquanto batia com a porta da rua e descalçava os seus sapatinhos Louboutin beringela, atirando-os pelo ar em voo certeiro até ao já esmurrado cão de loiça que e vaca da ex-sogra lhe tinha oferecido num Natal qualquer e que ela ainda não tinha tido disposição para pôr no lixo.

Atirou-se para o sofá, sentiu as calças demasiado justas, a apertar as coxas: "tenho que voltar ao ginásio, estou gorda que nem uma lontra. Pudera, este mês tem sido vernissage pindérica atrás de vernissage pindérica, onde só servem vinho da pipa e rissóis de camarão. Que porra de trabalho este!"

Pegou numa revista, para relaxar…tinha na capa a mulher do Quique Flores, estudou a foto com atenção: "Há! Então é esta puta com cara de ratazana deprimida que come o Quique Flores à colherzinha? Cabra! Deves ter mais florzinhas na testa que eu euros na conta!".

Largou a revista e ligou a TV, por sorte ia começar um filme bom na Fox, a preguiça era imensa mas foi até à cozinha, era impossível ver um filme sem estar a comer uma pipoquinha doce. "A dieta começa amanhã".
Xanuca B


Texto escrito para um passatempo do blog da pipoca mais doce.

quinta-feira

Dos Livros

“Ela começa a afastar-se. Ao fim de alguns passos volta-se e vê que ele ainda ali está, curvando-se para ver se a base dos sapatos tem uma etiqueta com o preço. O gesto tem algo de inocente e irreverente ao mesmo tempo e ela lembra-se, sem querer, das razões porque ainda o ama. Lembra-se a que ponto se sentiu agradecida quando ele voltou a aparecer na sua vida. Quando o voltou a encontrar estava a começar a ter medo de voltar a ser como antes de ir para Paris: insensível, fechada nos seus livros, sozinha. Lembrava-se do pânico que sentia por todos os seus amigos estarem casados. Tinha até pensado em pôr um anúncio. Mas ele tinha-a aceitado, e tinha apagado o seu desgosto anterior. Ela achava que ele seria incapaz de a magoar como Graham tinha feito. Após anos de relações clandestinas, era refrescante ter um namoro transparente, com o apoio dos seus pais desde o início, com um futuro inevitável e sem dúvidas, com um casamento em que eles também estavam envolvidos. E no entanto, a familiaridade que em tempos a tinha aproximado dele começou a transformar-se em prisão. Apesar de ela saber que a culpa não é dele, não consegue evitar de o associar, por vezes, com um sentido de resignação, com a própria vida a que ela tinha resistido e tinha lutado com tanta força para deixar para trás. Ele não era a pessoa com quem ela tinha imaginado ficar; nunca tinha sido essa pessoa. Talvez por essas mesmas razões, nesses primeiros meses, ao estar com ele, ao se apaixonar por ele, ao fazer precisamente o que tinham esperado dela toda a vida, isso tinha um sabor proibido, altamente transgressor, como uma ruptura no seu desejo instintivo.”

In “O Bom Nome” de Jhumpa Lahiri
Dom Quixote, Pág. 301